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Overshooting e Semi-convecção

Na nossa derivação de transporte de energia por convecção, supusemos que o elemento convectivo se desloca com uma velocidade $v$ por uma distância $\ell$ e então se dissolve no meio, liberando o calor. No topo da zona de convecção, onde o gradiente de temperatura real se torna menor do que o gradiente de temperatura adiabático, todos os elementos convectivos supostamente param, não penetrando nas camadas superiores, que são estáveis. Essa hipótese não é real, pois alguns elementos do fluido excederão a borda, entrando na região estável. Os efeitos desse sobreimpulso (overshooting) são: misturar a matéria de composição química diferente depois da interface convectiva e transportar algum calor, ou seja, uma maior mistura (extra-mixing). No modelo de comprimento de mistura, o transporte de fluxo pela energia cinética dos elementos não é incluída. Na zona de convecção no núcleo de estrelas massivas, o overshooting afeta o tempo de vida, pois mistura combustível nuclear e pode levar restos de queima nuclear até a superfície das estrelas, onde se tornam visíveis, como no caso das estrelas Wolf-Rayet. O grande problema é estimar a desaceleração do elemento e, portanto, quantificar o overshooting. Bernd Freytag, Hans Günther-Ludwig e Matthias Steffen (1996, A&A, 313, 497) estudaram o overshooting nas camadas superficiais do Sol, estrelas A e anãs brancas DAs através de modelos hidrodinâmicos. Nas suas simulações numéricas, os movimentos convectivos se extendem bem além das zonas instáveis. Para uma estrela tipo A de sequência principal, a massa na zona de "overshooting" é maior do que a massa na zona de convecção por um fator de 10. Para uma anã branca DA com Tef=12 200 K, a massa na zona de "overshooting" é maior do que a massa na zona de convecção por um fator de 100! Isto ocorre porque, nas simulações, o material descendente se concentra em tubos estreitos com altas velocidades, cercados de largas regiões ascendentes com velocidades comparativamente baixas.

Vittorio M. Canuto, em seu artigo de 2000 Semiconvection and Overshooting: Schwarzschild and Ledoux Criteria Revisited, no Astrophysical Journal, 534, L113, discute que o critério de Schwarzschild requer overshooting enquanto o critério de Ledoux não necessariamente. No seu artigo Overshooting in Stars: a New Formulation [Stellar Structure: Theory and Test of Connective Energy Transport, ASP Conference Series, Vol. 173. Edited by Alvaro Gimenez, Edward F. Guinan, and Benjamin Montesinos. Astronomical Society of the Pacific (San Francisco), ISBN: 1-886733-95-3 (1999), p.133] ele deduz um modelo para calcular o overshooting.

Semi-convecção é a mistura de elementos na interface da zona de convecção, devido à existência de descontinuidades na composição química. Por exemplo, para uma estrela de 10 $M_\odot$, a zona de convecção se expande com o tempo, causando uma descontinuidade na abundância do hidrogênio, X. Como a opacidade é dominada por espalhamento de elétrons e, como veremos na secção (T10), $K=0,2(1+X)~{cm^2/g}$ é descontínuo e, portanto, $\nabla_{rad}$ também, pois a equação de equilíbrio radiativo (equação 1.51) nos dá:

\nabla_{rad} = \frac{3}{16\pi acG}\frac{PK}{T^4}\frac{L_r}{M_r} (1)

Como
\nabla_{ad} = \frac{\Gamma_2-1}{\Gamma_2} (2)

e $\Gamma_2$ quase não depende da composição química, pois $\Gamma_2=5/3$ para um gás ideal, $\nabla_{ad}$ é contínuo. Devido à descontinuidade de $\nabla_{rad}$, existe uma pequena região fora da zona de convecção que não é radiativa, mas também não é convectiva. Nessa região, deve ocorrer uma mistura até que os gradientes de composição química não sejam descontínuos. Essa mistura chama-se de semi-convecção, ou convecção difusiva.
semiconveccao
No artigo Non-radial oscillation modes with long lifetimes in giant stars, de 2009 na Nature, 459, 398, Joris De Ridder e colaboradores demonstraram que as observações de 300 gigantes não conseguem ser reproduzidas com os modelos atuais, devido às incertezas no overshooting e semiconvecção. O mesmo problema acontece nos modelos da atmosfera da Terra, necessário para os cálculos de clima.

fingers Outro efeito que precisa ser levado em conta é a mistura por dedos de sal (salt fingers), também chamado de mistura termoalina, causados por instabilidade de difusão dupla, em que camadas de diferentes densidades e temperaturas se misturam, como as calculadas por Matteo Cantiello e Evert Glebbeek para as gigantes vermelhas. O nome vem do fenômeno nos oceanos, quando água mais quente e salgada está sobre uma camada de água menos salgada e mais fria.

$\nabla - \nabla_{ad} < 0, \nabla_\mu>0$   estável
$\nabla - \nabla_{ad} > 0, \nabla_\mu>0$   semi-convecção
$\nabla - \nabla_{ad} < 0, \nabla_\mu<0$   termoaline
Uma teoria de convecção que leva em conta os diversos tamanhos dos elementos de mistura turbulenta, sem parâmetros ajustáveis, e que calcula o transporte de energia levando em conta tanto a diferença de temperatura das camadas externas quanto a própria turbulência, foi desenvolvida por Vittorio M. Canuto, Itzchak Goldman e Italo Mazzitelli em 1996, no Astrophysical Journal, 473, 550. Vittorio M. Canuto, em seu artigo de 2002, ``Critical Richardson numbers and gravity waves'', publicado no Astronomy & Astrophysics, 384, p. 1119-1123, conclui que a convecção turbulenta gera ondas de gravidade que se propagam na região radiativa, agindo como uma fonte adicional de energia.
gautschy
Alfred Gautschy & Leandro G. Althaus publicaram no Astronomy and Astrophysics, v. 382, p.141-151 (2002) a comparação entre a teoria de comprimento de mistura (ML2) com a teoria de Canuto, Goldman e Mazitelli (CGM) para modelos de anãs brancas. Na figura temos a extensão da zona de convecção superficial, q=1-m/M*, dada pela região cinza pela teoria CGM e delimitada pelas linhas para a ML2, para diferentes valores de temperatura efetiva de um modelo de anã branca com 0,6 massas solares.
Vittorio M. Canuto, em cinco artigos publicados em 2011, no Astronomy & Astrophysics, 528, 76, 77, 78, 79, e 80, discute a aplicação de modelos de tensão de Reynolds, atualmente utilizados nos modelos atmosféricos e oceânicos, à convecção das estrelas. Este formalismo é derivado das equações de movimento de fluidos de Navier-Stokes [Claude-Louis Navier (1785-1856) e Sir George Gabriel Stokes (1819-1903)], que incluem difusão e pressão.

Uma das razões da necessidade de nova teoria vem do fato de que no Sol, os modelos, por exemplo, L. Deng & D.R. Xiong (2008, IAU Symposium 252, ed. L. Deng, & K. L. Chan, Cambridge University Press, p. 83) e simulações numéricas de overshooting resultam em uma região uma ordem de magnitude maior do que a resultante da inversão dos dados de hélio-sismologia, por exemplo, Jorgen Christensen-Dalsgaard et al. 2011, Monthly Notices of the Royal Astronomical Society, 414, 1158.

Q. S. Zhang, em seu artigo de 2013, no Astrophysical Journal Supplement (arXiv:1303.0139), discute que o overshooting pode ser representado por difusão, com um coeficiente único para o Sol e para estrelas entre 2 e 10 massas solares. Em geral um único coeficiente não consegue representar condições muito distintas.

Abundância dos Elementos

Dada a massa e a idade de uma estrela, sua estrutura interna completa é determinada por somente uma outra propriedade básica, sua composição química inicial.

Normalmente, a composição é especificada por três parâmetros: X, Y, Z.

As abundâncias são definidas em termos de fração de massa: X representa a massa em hidrogênio em uma grama de massa estelar, de modo que
{X+Y+Z=1}

O inverso do peso molecular médio é dado por:
\frac{1}{\mu}=\sum_i \frac{X_i}{A_i}
onde $X_i$ é a abundância por massa do elemento $i$, e $A_i$ seu peso atômico.

Como um exemplo, um gás de carbono puro tem $1/\mu=1/12$, ou seja $\mu=12$, enquanto um gás de hidrogênio puro tem $1/\mu=1/1$, ou seja $\mu=1$.

Se uma fração $y_i$ do elemento $i$, com $Z_i$ prótons, está ionizada, o peso molecular médio dos elétrons, $\mu_e$ será:

\mu_e = (\sum_i \frac{Z_i X_i y_i}{A_i})^{-1} (3)
e
{\mu = (\frac{1}{\mu_i}+\frac{1}{\mu_e})^{-1}}
Se o gás tiver 75% de H, X=0,75 e 25% de He, Y=0,25:
\frac{1}{\mu_i} = \frac{0,75}{1}+\frac{0,25}{4} = \frac{1}{1,23}
e se o gás estiver completamente ionizado
\frac{1}{\mu_e} = \frac{0,75}{1}+\frac{2\times 0,25}{4} = \frac{1}{1,143}
Sol
Ionização nas camadas externas do Sol.
Embora a composição química do Sol possa ser obtida do estudo de seu espectro, as linhas de hélio no espectro do Sol, que deram origem ao nome do elemento, são linhas cromosféricas e, portanto, em condições físicas em que a determinação da abundância é imprecisa. A abundância dos outros gases nobres, principalmente do Ne, também são imprecisas. Um valor comumente usando para a abundância de hélio é Y=0,245, determinado por Nicolas Grevesse & Arlette Noels, 1993, em Origin and Evolution of the Elements, eds. Nikos Prantzos, Elisabeth Vangioni-Flam & Michel Cassé, Cambridge University Press, 15.

Em 2005, o mesmo Nicolas Grevesse, com Martin Asplund & A. Jacques Sauval publicaram redeterminações da composição solar, European Astronomical Society Publications Series, Volume 17, 2005, p.21, usando novas probabilidades de transição, modelos tridimensionais e fora de equilíbrio termodinâmico local, e encontraram Y=0,165, o que levou a modelos completamente diferentes e inconsistentes com as observações heliosismológicas (Sarbani Basu & H. M. Antia, no artigo Helioseismology and solar abundances, 2008 Physics Reports, 457, 217). Aldo M. Serenelli e Sarbani Basu, no Astrophysical Journal de 2010 (719, 865), utilizam a abundância superficial do Sol obtida pela sismologia, de YsuperficialSol=0,2485 ± 0,0035, com uma incerteza na taxa de difusão de 20%, e os modelos de convecção, para encontrar a abundância primordial de YinicialSol=0,278 ± 0,006.

A idade do Sol, obtida pelo decaimento radiativo em meteoritos antigos, desde o início da sequência principal, está entre 4,563 e 4,576 bilhões de anos, de acordo com Gerald J. Wasserburg em John N. Bahcall & Marc Pinsonneault (1995, Reviews of Modern Physics, 67, 781).

A mais recente determinação das abundâncias solares é Nicolas Grevesse, Martin Asplund, A. Jacques Sauval & Pat Scott, 2010, Astrophysics & Space Science, 328, 179, obtendo X=0,7380, Y=0,2485 e Z=0,0134, consistente com a heliosismologia.

Variação da composição com o tempo

Nas regiões radiativas, não há troca de matéria entre as camadas da estrela se desprezarmos a difusão. Portanto, as frações dos elementos químicos $X_i$ só podem mudar se as reações nucleares criarem ou destruírem os elementos de tipo $i$, no elemento de massa em consideração.

A freqüência das reações nucleares é descrita por taxas de reação $r_{lm}$, representando o número de reações por unidade de volume e tempo que transformam elementos do tipo $l$ em elementos do tipo $m$. Em geral, um elemento do tipo $i$ pode ser afetado simultaneamente por muitas reações, algumas que criam o elemento $(r_{ji})$, e outras que o destroem $(r_{ik})$. Essas taxas de reações nos dão diretamente a variação de $n_i$ por segundo. Como

 X_i \equiv \frac{m_in_i}{\rho} (4)

 \frac{\partial X_i}{\partial t} = \frac{m_i}{\rho} [\sum_j r_{ji} - \sum_k r_{ik}]\quad {i=1,\ldots,I} (5)

para qualquer elemento 1,...,I envolvido nas reações.

A reação $p arrow q$ em que um elemento do tipo $p$ é transformado em um elemento do tipo $q$ está associada a uma liberação de energia $e_{pq}$. Na equação de conservação de energia, nós usamos a taxa de geração de energia por unidade de massa $\varepsilon$, que normalmente contém contribuições de muitas reações diferentes:

 \varepsilon = \sum_{p,q} \varepsilon_{pq} = \frac{1}{\rho} \sum_{p,q} r_{pq}e_{pq}
(6)
Vamos definir qpq como a energia gerada quando uma unidade de massa do elemento de tipo p é transformada em um elemento do tipo q:

q_{pq} \equiv \frac{e_{pq}}{m_p}
(7)
Podemos, então, reescrever a variação da composição química (4) em termos de $\varepsilon$:
 \frac{\partial X_i}{\partial t} (8)
Se representarmos a queima de hidrogênio por uma taxa geral $\varepsilon_H$, por exemplo, podemos escrever:
\frac{\partial X}{\partial t} = -\frac{\varepsilon_H}{q_H}
e como
\sum_i X_i = 1
obtemos $\partial Y /\partial t = -\partial X/\partial t$, onde $q_H$ é a energia liberada por unidade de massa quando o hidrogênio é convertido em hélio, se não houver queima de hélio simultânea.

Difusão

dcdx Efeitos microscópicos (movimentos randômicos) também podem mudar a composição química de uma camada no interior da estrela. Se existem gradientes nas abundâncias dos elementos, a difusão tende a reduzir as diferenças. A difusão se dá por movimentos randômicos das partículas. A teoria macroscópica da difusão foi proposta em 1855 pelo fisiologista alemão Adolf Eugen Fick (1829-1901) [Ann. Physik Leipzig, 170, p 59, 1855], que mais tarde inventaria as lentes de contato, propondo duas leis, relacionado o fluxo de partículas $J$ com o gradiente da concentração $c$ por um coeficiente de difusão $D$, em analogia ao transporte de calor por um gradiente de temperatura:

\vec J= -D \vec \nabla c

e a segunda lei de Fick, que, na verdade, é uma equação de continuidade:

\frac {\partial c}{\partial t}
= -\vec\nabla \cdot \vec J =
\vec{\nabla}\cdot D\vec\nabla c
(9)

Em 1905, Albert Einstein demonstrou que as leis de Fick eram válidas, e que o coeficiente de difusão $D$ era relacionado com o coeficiente de fricção $f$ por:

D = \frac{\Re T}{f}

onde $T$ é a temperatura, $\Re$ a constante do gás, para um fluxo dado em mol  ${cm}^{-2}~{s}^{-1}$. Em 1952, o inglês Sydney Chapman (1888-1970) e Thomas George Cowling (1906-1990) detalharam o estudo estatístico da difusão, comprovando as duas leis de Fick.

Escrevendo o fluxo $\vec J = c \vec v_D$, onde $v_D$ é a velocidade de difusão, obtemos

 \vec v_D = - \frac {D}{c}\vec \nabla c (10)

e no caso de um coeficiente de difusão $D$ constante:
 \frac{\partial c}{\partial t} = D \nabla^2c (11)

Uma estimativa grosseira do tempo característico de difusão é:

\tau_D = \frac{S^2}{D}
(12)

onde $S$ é um comprimento característico da variação da abundância $n_i$ correspondente à concentração $c$.

Uma generalização da velocidade de difusão (equação 10) é:

 \vec v_D = \frac{D}{c}(\vec\nabla c + k_T\vec\nabla \ln T + k_P\vec\nabla \ln P) (13)

com os coeficientes de difusão por temperatura $k_T$ e de difusão por pressão $k_P$ definidos apropriadamente.

Vamos, primeiro, considerar o efeito de difusão por concentração e por temperatura.

cos
Assumamos que o gradiente de temperatura é perpendicular ao plano $x-y$ em um sistema cartesiano; nesse caso, o fluxo de partículas de um certo tipo na direção $+z$, devido ao movimento estatístico (randômico) das partículas, será determinado pela densidade $n_i$ e pela velocidade média $\bar{v}$, ambos medidos em $z=-\ell$, onde $\ell$ é o livre caminho médio das partículas deste tipo:
 J^+ = \frac{1}{6}c(-\ell)\,\bar{v}(-\ell) (14)

onde o fator de 1/6 origina da média sobre $\cos^2\theta$, pois queremos o fluxo perpendicular ao plano $x-y$ e tanto v quanto c são na direção r qualquer.

Se expandirmos $n_i$ e $\bar{v}$ em $z=0$ na equação (14), e em uma equação correspondente para o fluxo $J^-$ na direção $-z$:

 J^\pm = \frac{1}{6}[c(0)\mp\frac{\partial c}{\partial z...  ...ft[\bar{v}(0)\mp\frac{\partial \bar{v}}{\partial z}\ell] (15)

e, portanto, existe um fluxo líquido
 J = J^+ - J^- (16)

que, em geral, não é nulo.

Consideremos a velocidade de difusão relativa $v_{D_1} - v_{D_2}$ devido ao movimento de dois tipos diferentes de partículas (1,2), com fluxos $J_1$ e $J_2$, e concentrações $c_1$ e $c_2$:

 v_{D_1} - v_{D_2} = \frac{J_1}{c_1} - \frac{J_2}{c_2} (17)

Com a equação (16), podemos substituir os fluxos $J_i$, e considerando a energia cinética média como a energia térmica:
 E_i = \frac{1}{2}\mu_i \bar{v}^2 = \frac{3}{2}\Re T (18)

onde $\mu_i$ é o peso molecular médio, podemos obter
 v_{D_1} - v_{D_2} = - \frac{D}{c_1c_2} (\frac{\partial c_1}{\partial z}+ k_T \frac{\partial \ln T}{\partial z}) (19)

onde
D (20)

 k_T = \frac{1}{2}\frac{\ell_1\sqrt{\mu_2}-\ell_2\sqrt{\mu_1}} {\ell_1c_2\sqrt{\mu_2}+\ell_2c_1\sqrt{\mu_1}} c_1c_2(c_2-c_1) (21)

onde $\ell_1$ e $\ell_2$ são os livres caminhos médios das duas espécies.

Da equação (20) podemos ver que o coeficiente de difusão é da ordem de

 D \simeq (\frac{\Re T}{3})^\frac{1}{2} \ell \simeq \frac{1}{3}v^*\ell (22)

onde v* e $\ell$ são representativos das velocidades estatísticas e livre caminho médio dos componentes.

Se considerarmos uma mistura de hidrogênio e hélio, $v_D = v_H - v_{He}$ é a velocidade de difusão. Se $v_D > 0$, o hidrogênio se difunde na direção de menor temperatura, isto é, para cima na estrela. Para a região central do Sol ($T\simeq 10^7$ K, $\rho \simeq 100$ g cm-3, $\ell \simeq 10^{-8}$ cm e $D\simeq 6~{cm}^2\, {s}^{-1}$ e para um comprimento característico de difusão de $S \simeq R_\odot \simeq 10^{11}$ cm, o tempo característico de difusão (equação 12) será $\tau_D \simeq 10^{13}$ anos. Apesar desse tempo de difusão ser muito maior do que a idade do Universo e, portanto, difusão ser irrelevante no Sol, no caso de estrelas anãs brancas, a difusão se dá em escalas de tempo de milhões de anos.

Vamos, agora, considerar a difusão por pressão, que normalmente é chamada de sedimentação ou deposição gravitacional. Uma consideração estatística como no caso da difusão por temperatura mostra que existe difusão mesmo nas camadas isotérmicas, com um gradiente de pressão não-nulo. Chapman e Cowling (1952), em seu livro The Mathematical Theory of Non-Uniform Gases, Cambridge University Press, detalham como obter $k_P$, que não vamos reproduzir aqui, pois C. Paquette, Claude Pelletier, Gilles Fontaine & Georges Michaud, 1986, "Diffusion Coefficients for Stellar Plasma" (Astrophysical Journal Supplement Series, 61, 177) discutem que as aproximações introduzidas por Chapman e Cowling para calcular os coeficientes de difusão analiticamente introduzem erros sistemáticos, e calculam aproximações mais realísticas estimando numericamente as integrais de colisão usando o potencial Coulombiano com escudamento.

Assumindo que um material consiste de dois componentes (1,2), gases ideais com pesos moleculares $\mu_i$ e pressões $P_i$, podemos definir a escala de altura de pressão

 \lambda_{P_i} \equiv -\frac{dr}{d\ln P_i} (23)

que com a ajuda da equação de equilíbrio hidrostático ($dP_i/dr=-g\rho$) e da equação de estado de um gás ideal ($P_i = \Re \rho_i T/\mu_i$) pode ser escrita como
\lambda_{P_i} = \frac{P_i}{g\rho_i} = \frac{\Re T}{g\mu_i} (24)

Cada elemento i terá sua escala de pressão. As densidades das partículas são proporcionais a $P_i$, que são aproximadamente proporcionais a
 P_i \propto \exp(-\frac{r}{\lambda_{P_i}}) (25)

Portanto, a componente com maior peso molecular médio cai mais rapidamente na direção $r$ do que a componente com menor peso molecular, de modo que o elemento mais pesado se move para baixo do elemento mais leve. Essa difusão ocorre mesmo que os elementos inicialmente estivessem totalmente misturados. Para as estrelas da seqüência principal, tanto $\vert k_T\vert$ quando $\vert k_P\vert$ são da ordem de um e, portanto, a separação dos elementos não ocorre, mas para as estrelas anãs brancas a difusão leva à separação total dos elementos.

Regiões convectivas

As regiões convectivas têm um alto poder de mistura por movimentos turbulentos, em uma escala de tempo muito maior do que as mudanças causadas pelas reações nucleares e, portanto, podemos assumir que as regiões convectivas permanecem homogêneas:

convec
 \frac{\partial X_i}{\partial r} = 0 (26)

Se uma zona convectiva se estende de $r_1$ a $r_2$, dentro desse intervalo todos $\bar{X}_i$ são constantes. Mas, como as bordas da zona de convecção podem mudar com o tempo, as abundâncias no interior da zona de convecção mudam
 \frac{\partial \bar{X}_i}{\partial t} (27)

Os valores de $X_{i1}$ e $X_{i2}$ devem ser tomados do lado de fora da borda que está se movendo. A integral descreve a mudança devido às reações nucleares, mas também devido ao movimento das bordas para regiões de composição distinta. Essas mudanças podem causar o transporte de cinzas de reações nucleares para a superfície da estrela, como ocorre no ramo das gigantes e supergigantes, em que a zona de convecção se estende por quase toda a estrela, bem como pode levar novo combustível nuclear para a região de reações nucleares.

Vittorio M. Canuto, em seu artigo de 2000 no Astrophysical Journal, Volume 534, p. L113-L115, ``Semiconvection and Overshooting: Schwarzschild and Ledoux Criteria Revisited'', discute a necessidade de se incluir estes efeitos. Paula Jofré e Achim Weiss mostram no seu artigo no Astronomy & Astrophysics de 2011, 533, 15, que se não levam em conta a difusão nas estrelas do halo na nossa Galáxia, a idade obtida é de 14 a 16 Ganos, incoerente com a idade do Universo. Quando levam em conta a difusão, como o hidrogênio difunde para cima, saindo do núcleo, existe menos combustível nuclear e a saída da sequência principal é mais rápida. Os coeficientes de difusão do H e do He foram publicados por Anne A. Thoul, Johm N. Bahcall & Abraham Loeb, no 1994,Astrophysical Journal, 421, 828. Neste caso a idade é de 10 a 12 Ganos, comprovando então que é necessário levar em conta a difusão na evolução estelar, especialmente para as estrelas de baixa metalicidade, que têm envelope convectivo razo e há difusão por um longo tempo. As isócronas Y2 (Yonsei-Yale: Pierre Demarque, Jong-Hak Woo, Yong-Cheol Kim & Sukyoung K. Yi, 2004, Astrophysical Journal Supplement Series, 155, 667) também incluem difusão de H e He, e também concordam com a idade de 10 a 12 Ganos. Os modelos PARSEC: PAdova and TRieste Stellar Evolution Code de Alessandro Bressan, Paola Marigo, Léo Girardi, Bernardo Salasnich, Claudia Dal Cero, Stefano Rubele & Ambra Nanni, publicados em 2012 no Monthly Notices of the Royal Astronomical Society, 427, 127, também incluem difusão na sequência principal.

A difusão, levando os elementos mais pesados para baixo, também faz com que a metalicidade observada hoje em dia não seja a metalicidade primordial. Existe ainda a levitação radiativa, que faz que elementos com bandas de absorção em comprimentos de onda de alto fluxo sejam carregados para as camadas externas, como o ferro, e terras raras nas estrelas Ap.


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Modificada em 1 abril 2015