Efeito Zeeman

A energia em um campo magnético B em um esfera de raio R é dada por
E_B=\frac{1}{6}B^2 R^3
A pressão magnética
P_B=\frac{1}{3}\frac{B^2}{8\pi}
resulta da ordem de $P_B\simeq 1 \times 10^{18}$ dinas/cm$^2$, comparada com a pressão do gás, hidrostática,
P_{gás}\simeq \frac{GM^2}{R^4}
da ordem de $4 \times 10^{23}$ dinas/cm$^2$ para o interior de uma anã branca. A densidade de energia potencial magnética é dada por
E_B=\frac{B^2}{8\pi}
no sistema cgs e
E_B=\frac{B^2}{2\mu_0}
no sistema mks, onde $\mu_0$ é a permeabilidade do espaço livre, uma constante valendo $4\pi\times 10^{-7}$ weber/(ampere.metro).

orbitais Quando um elétron atômico está em um campo magnético, o Hamiltoniano tem termos adicionais

\cal{H}}_M = \frac{eB}{2mc}(k_l+2 k_s) + \frac{e^2B^2}{8mc^2}r^2 \mbox{sen}^2 \theta
onde $k_l$ e $k_s$ são os operadores momentum angular orbital e de spin projetados ao longo do campo, e $r$ e $\theta$ são coordenadas polares em relação à direção do campo. Como $\Delta s=0$ para transições de dipolo elétrico, o spin não tem efeito no espectro e pode ser ignorado.

O primeiro termo no Hamiltoniano produz tripletos de Lorentz ($\Delta m_l=0,\pm 1$, com uma separação da ordem de 10Å/MG em 4500Åe 20,115Å/MG em H$\alpha$. Para campos acima de 10 MG o efeito quadrático (diamagnético) precisa ser levado em conta, e o termo linear (paramagnético) $E_l$ pode ser comparado com o quadrático $E_q$

\frac{E_L}{E_q}\simeq 4,55 \times 10^{-6}\frac{E_l}{\mbox{46 cm$^{-1}$}} \frac{B}{\mbox{MG}}\,n^4
de modo que para um campo de 10 MG, o termo quadrático é pequeno para H$\alpha$, mas igual ao efeito linear para H$\gamma$ e dominante para os níveis mais altos. O termo quadrático é sempre positivo, deslocando para o azul. O efeito de campos fortes foi descrito por Louis Paschen (1865-1947) e Ernest Back (1881-1959) em 1912.

Para átomos com linhas singletos (S=0), um campo magnético fraco separa cada nível em 2J+1 níveis igualmente espaçados, onde J é o momentum angular total (ml+ms). De acordo as observações do físico holandês Pieter Zeeman (1865-1943) (1897, "The Effect of Magnetisation on the Nature of Light Emitted by a Substance", Nature, 55, 347) e a explicação teórica de seu professor Hendrik Antoon Lorentz (1853-1928) (1897), os níveis de energia são dados por

E_k = E_n \pm k\frac{ehB}{4\pi mc} = E_n \pm k h \nu_L
para valores de k inteiros entre 0 e J, $E_n$ é o valor da energia sem o campo magnético, B é a intensidade do campo magnético, o fator $\frac{eh}{4\pi mc}=9,2731 \times 10^{-21}$ ergs/gauss é o momento de Bohr do magnetron, e $\nu_L=\frac{ehB}{4\pi mc}=1.400 \times 10^6 B$ Hz é a freqüência de Larmor de precessão do elétron em torno do campo magnético, para B dado em gauss [Sir Joseph Larmor (1857-1942), 1897, "The Influence of a Magnetic Field on Radiation Frequency". Proceedings of the Royal Society of London, 60, 514, Zeeman e Lorentz receberam o prêmio Nobel de 1902 pela descoberta do efeito Zeeman.

As regras de seleção para as transições permitidas entre os diferentes níveis são $\Delta k=0,\pm 1$, e um nível com k=0 não pode se combinar com outro nível de k=0. Como o espaçamento é igual para todos os componentes, cada nível de um singleto se separa em tres componentes, a componente $\pi$ com a mesma freqüência inicial, e as duas componentes $\sigma$ deslocadas pela freqüência de Larmor. A componente $\pi$ é plano polarizada no plano contendo a linha de visada e o vetor do campo magnético. As duas componentes $\sigma$ são polarizadas elípticamente. Nas observações na direção do campo magnético, a componente central $\pi$ não é detectada e as duas componentes $\sigma$ serão circularmente polarizadas em direções opostas de rotação, com a de mais baixa freqüência sendo a com rotação horária). Na direção perpendicular ao campo, as três componentes são visíveis, mas a central mostra polarização linear paralela ao campo e as outras duas mostram polarização linear perpendicular ao campo.

A intensidade observada dependerá da intensidade que seria produzida se não houvesse campo magnético, da inclinação $\theta$ do vetor campo magnético com a linha de visada, e das características de polarização do detector. O americano Frederick Hanley Seares (1873-1964) calculou as intensidades dos feixes com polarização circular (1913, Astrophysical Journal, 38, 99). Os campos magnéticos no Sol têm de um a centenas de gauss [Horace Wellcome Babcock (1912-2003) e Harold Delos Babcock (1882-1968), 1955, Astrophysical Journal, 121, 349] e o meio interestelar de $1\mu $G.

De acordo com George W. Preston (1970, Astrophysical Journal, 160, L143):

\Delta \lambda_{\mbox{linear}} (\mbox{\AA}) = \pm 4,67 \times 10^{-13} \lambda^2 B
que corresponde a 20 Å/MG em Hα

Quando o campo é fraco e o spin é diferente de zero, ocorre o efeito Zeeman anômalo, por acoplamento spin-órbita, com os níveis de energia calculados por Thomas Preston (1860-1900) ['Radiation phenomena in a strong magnetic Magnetic Field', Proceedings Royal Society, 63 (1898)] e Alfred Landé (1888-1976) em 1920 e 1923, como

E_k = E_n \pm kg\frac{ehB}{4\pi mc} = E_n \pm kg h \nu_L
com o fator de Landé, g, dado por [G.E. Uhlenbeck & S. Goudsmit, Naturwissenschaften 47 (1925) 953; Nature 117 (1926) 264]:
g = 1 + \frac{J(J+1)+S(S+1)-L(L+1)}{2J(J+1)}
onde J é o momentum angular total, S o momentum angular de spin e L o momentum angular orbital.

O número de componentes depende de J, L e S dos níveis superiores e inferiores. As observações perpendiculares ao campo mostram a componente $\pi$ linearmente polarizada paralela ao campo e as componentes $\sigma$ linearmente polarizadas perpendicular ao campo, enquanto que as observações paralelas ao campo mostram somente as componentes $\sigma$, circularmente polarizadas.

E_k = E_n \pm (k_L+2k_s)\frac{ehB}{4\pi mc} = E_n \pm (k_L+2k_s) h \nu_L
onde os números quânticos $k_L$ e $k_L$ assumem valores entre $\pm L$ e $\pm S$ respectivamente, e as regras de seleção são $\Delta k_L=0,\pm 1$ e $\Delta k_S=0$.

O termo quadrático do deslocamento Zeeman para o hidrogênio (F.A. Jenkins & E. Segré 1939, Physical Review, 55, 52) será da ordem de

\Delta \lambda_q \simeq -4,98 \times 10^{-23} \lambda^2 n^4 (1+k^2)B^2~\mbox{\AA}
onde $a_0$ é o raio da primeira órbita de Bohr, n o número quântico principal e k o número quântico magnético (ml+ms) do nível superior.

Para as linhas de Balmer do hidrogênio, o deslocamento do centróide da componente $\sigma$ ($m_l=\pm 1$) é o dobro daquela da componente $\pi$ ($m_l=0$). O deslocamento quadrático da centróide será

\langle \Delta \lambda_q\rangle = -7,5 \times 10^{-23}
\lambda^2 n^4 B^2~\mbox{\AA}
Por exemplo, $\langle \Delta \lambda_q\rangle=0,25$ Åpara H$\alpha$ e 0,45 Å para H$\beta$ em um campo de 1 MG.

De acordo com Anders Blom enquanto no sistema não perturbado os números quânticos são n, $\ell$, $m_\ell$ e $m_s$, de spin, com os estados degenerados em $m_\ell$ e $m_s$, na presença de um campo magnético externo os $m_\ell$ e $m_s$ não são mais bons números quânticos, mas sim sua soma, $m=m_\ell + m_s$. Desta forma, para $\ell=1$, $m_\ell=\pm 1,0$ e $m_s=\pm 1/2$, teremos quatro estados, com m=± 3/2 e ± 1/2.

Para um átomo hidrogênico,

\Delta E_{n\ell m} = E_0 + \Delta E_{rel} + \Delta E_{\ell m}(B) + \Delta E_{Darwin}\delta_{\ell 0}
onde
E_0 = - \frac{\mu c^2}{2} \frac{(Z\alpha)^2}{n^2}
é a energia não perturbada, $\mu$ a massa reduzida do elétron,
\Delta E_{rel} = \frac{1}{2}m_e c^2 \frac{(Z\alpha)^2}{n^4}[\frac{3}{4}-\frac{n}{\ell+1/2}]
Para $\ell=0$ o termo Darwin precisa ser incluído
\Delta E_{Darwin} = \frac{m_e c^2}{2}\frac{(Z\alpha)^2}{n^3}
e a contribuição linear para a energia devido à interação do campo magnético com o spin-órbita é
\begin{eqnarray} \Delta E_{\ell m}(B)
&=&W [\ell \pm (\ell +1)\frac{B}{B_0}] \quad  |m| = \ell+\frac{1}{2}, \ell \neq 0\cr
&=&\frac{W}{2}[ 2m\frac{B}{B_0} - 1 \pm \sqrt{(\frac{B}{B_0})^2 + 4m \frac{B}{B_0} + (2\ell+1)^2}  \quad |m| = \ell-\frac{1}{2}, \ell \neq 0\cr
&=&\pm B \mu_B \quad  \ell=0
\end{eqnarray}
onde W = \frac{m_e c^2}{4} \frac{(Z\alpha)^4}{n^3\ell(\ell+1/2)(\ell+1)} e
B_0 = \frac{W}{\mu_B}

é o campo interno, da ordem de 1 tesla = $10^4$ gauss para um átomo de hidrogênio. A solução para campo forte $B/B_0 \gg (2\ell+1)$ não depende de $\ell$,
\Delta E_{\ell m}(B) = B \mu_B (m \pm \frac{1}{2})
é chamada de efeito Zeeman normal e não depende de $\ell$, enquanto a solução de campo fraco é chama de efeito Zeeman anômalo. $\mu_B$ é o momento magnético do elétron (Bohr) e α é a constante de estrutura fina.

As regras de seleção para as transições advém da Fórmula de Ouro de Fermi, que indica que as transições de um estado a para um estado b só ocorrem se existe sobreposição dos dois estados, isto é, se $ \langle b\vert\vec{r}\vert a \rangle$ for não nulo. Como cada estado $ a=(n,\ell,m_\ell,m_s)$, as regras resultam em

\Delta m_s = 0 \quad\quad \Delta \ell=1 \quad\quad \Delta m_\ell = 0,\pm 1
Para campos fortes, o termo quadrático mistura os níveis n. Dayal T. Wickramasinghe et al. (2000) mostra que isto ocorre para B>4700/n7/2, isto é, para o n=1 isto ocorre em 4700 GG, mas para n=6 isto já ocorre em 9 MG.

Gary Schmidt, da Universidade do Arizona, afirma que quando se calcula corretamente pela mecânica quântica, não existem fórmulas simples e é melhor interpolar as tabelas de Hanns Ruder et al. publicadas no livro Atoms in Strong Magnetic Fields: Quantum Mechanical Treatment and Applications in Astrophysics and Quantum Chaos, Springer-Verlag Telos (1994). Isto ocorre porque os métodos perturbacionais usados falham completamente para campos da ordem de 10 MG e superiores, já que a simetria do campo Coulombiano é esférica e pode ser representado por esféricos harmômicos, e cilíndrica do campo magnético externo, o que não permite a separação de variáveis. Se representarmos por esféricos harmônicos, precisamos de uma base com 3600 termos, como usados por Günter Wunner, F. Geyer e Hanns Ruder (1987, Astrophysics and Space Science, 131, 595) ou 6400 termos (Physica Scripta, 36, 291, 1987). Mesmo campos de 1 MG (100 Tesla) alteram completamente a estrutura eletrônica, pois as forças magnéticas atuando sobre o elétron, mesmo nos níveis mais baixos de energia, são da ordem das forças coulombianas. Estes artigos trazem os comprimentos de onda para Hβ e Hγ para campos de 4,7 a 470 MG. H. Forster, W. Strupat, W. Rösner, Günter Wunner, Hanns Ruder & H. Herold, de Tübingen (1984, J. Phys. B: Atomic and Molecular Physics, 17, 1301) trazem os valores de Hα. Por exemplo, a componente 3d-1-2p-1 se desloca de 6565Å para B=0.47 MG, para 6562Å para 4.7 MG, 6462Å para 32.9 MG, 6370Å para 47 MG, 5980Å para 94 MG, 5577Å para 141 MG, 4900Å para 235 MG, 4391Å para 329 MG e 3839Å para 470 MG.

Wunner e Ruder
Christoph
Posição das linhas de hidrogênio para distintos valores do campo magético.
Günter Wunner e Hanns Ruder também lembram que existe uma variaço de pelo menos um fator 2 de inomogeneidades do campo para um dipolo. O deslocamento Zeeman observado nas linhas das estrelas representa o campo médio na superfície da estrela. Se o campo tiver a forma de um dipolo, o campo médio está relacionado ao campo polar por
B = 1/2 Bp

 

1+3 cos2 θ
 
onde Bp é o campo polar e θ é o ângulo entre o campo e a linha de visada.
Mais precisamente, para campos mais fortes que 10 kG, mas mais fracos que 2 MG, isto é, no limite de Paschen-Back, as linhas de mais baixo n (n>4) serão separadas em três componentes, com as componentes laterais separadas por cerca de
Δλ = ±4.67×10-7 λ2 B
com λ em Ångstrons e B em MG.
O deslocamento quadrático é dado por
Δλq = - e2

a02
8mc32 n4 (1+ml2)B2 =-4.97 ×10-23 λ2 n4 (1+ml2)B2 Å
onde a0 é o raio de Bohr, e ml o número quântico magnético. Esta fórmula é válida para as transições de 2p para ns e 2p para nd, onde n é o número quântico principal. Para as transições de 2s para np,
Δλq=-4.97 ×10-23 λ2 [n2(n2-1)(1+ml2-28)B2 Å
(Jenkins F.~A., Segré E., 1939, PhRv, 55, 52). Note que por causa da dependência com n4 do efeito Zeeman quadrático, mesmo campos de 1 MG, mostram deslocamentos quadráticos para n>7.

Magneticas
Magneticas
Magneticas
Espectros de anãs brancas magnéticas publicados por S. O. Kepler, Ingrid Pelisoli, Stefan Jordan, Scot J. Kleinman, Detlev Koester, Baybars Külebi, Viviane Peçanha; Bárbara Garcia Castanheira, Atsuko Nitta, José Eduardo da Silveira Costa, Don Earl Winget, Antonio Kanaan & Luciano Fraga, no artigo Magnetic white dwarf stars in the Sloan Digital Sky Survey, 2013, Monthly Notices of the Royal Astronomical Society, para as estrelas a) Plate-MJD-Fiber=1954-53357-393, 13 MG, SDSS~J101428.10+365724.40, b) 0415-51879-378, 11 MG, J033145.69+004517.04, c) 1616-53169-423, 2.4 MG, 123414.11+124829.58, d) 2277-53705-484, 2.2 MG, 083945.56+200015.76. e) 2772-54529-217, 2.2 MG, 141309.30+191832.01, f) 2694-54199-175, 1.7 MG, 064607.86+280510.14, g) 2376-53770-534, 2.6 MG, 103532.53+212603.56, h) 2417-53766-568, 9.9 MG, 031824.20+422651.00, i) 2585-54097-030, 14 MG, 100759.81+162349.64, j) 2694-54199-528, 1.3 MG, 065133.34+284423.44, k) 0810-52672-391, 11 MG, 033145.69+004517.04, l) 1798-53851-233, 14 MG, 131508.97+093713.87, m) 2006-53476-332, 19 MG, 125715.54+341439.38, n) 2644-54210-167, 1.9 MG,121033.24+221402.64, o) 2430-53815-229, 2.5 MG, 085106.13+120157.84. As linhas vermelhas são modelos não magnéticos, obviamente inadequados.


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Modificada em 24 jan 2013